quarta-feira, 10 de julho de 2013

O que está na base do retrocesso da Guiné-Bissau?

Alberto Luís Quematcha

Entre os guineenses ouve-se falar muito sobre as nossas grandes “qualidades”: o guineense é solidário, hospitaleiro, o guineense ama e tem orgulho da sua terra (fidju di tchon). Ainda, não é raro ouvir a expressão: “o povo guineense é pacífico, humilde e trabalhador. Nós perguntamos se o guineense é tudo isto, o porquê dos conflitos, arrogância, difamações entre guineenses e retrocesso? Ou seja, onde realmente reside a razão do retrocesso? O que é que está na base do retrocesso do país?

Outrossim, ouve-se falar, entre nós, que os políticos e militares são piores filhos da nossa terra, são pessoas desonestas. São recusados e criticados severamente. E que estes é que estão na origem do retrocesso do país.

Daí é que achamos que há uma contradição. Se os guineenses são solidários, pacíficos e humildes, como é que os militares e políticos, duma forma isolada, não seriam tudo isso? Uma vez que eles também são guineenses, “fidjus di tchon”.

Segundo Émile Durkheim, um pensador francês, a sociedade possui o poder de influenciar  os indivíduos. De acordo com este pensador, na vida em sociedade, o homem se defronta com regras e condutas sociais que não foram directamente criadas por ele, mas que existem e são aceites na vida em sociedade, devendo ser seguido e aceite por todos. O conjunto destas regras e condutas são denominadas de facto social. Ou seja, o facto social é um conjunto de maneira de pensar, de agir e sentir exteriores ao indivíduo, e dotados de um poder coercitivo em virtude do qual se lhe impõem.

Na esteira do pensamento deste sociólogo, achamos que a maioria é que determina o comportamento da minoria. Se não vejamos, no seio da sociedade civil, quem é que é “matchu”? O “matchu” é aquele que briga e não aquele que evita conflitos. A pessoa que foge de conflitos é encarada como covarde e fraca.

Ainda, no seio da mesma sociedade, todo o governante que se enriquecer num curto espaço de tempo é “matchu”, e é uma pessoa que sabe aproveitar, mesmo que seja um locupletamento alheio. Qualquer pessoa que for governante, que não conseguir acumular riquezas, que não fez uso dos bens públicos para proveito próprio e da sua família é encarada como “burro”, “estúpido”, “idiota”, “ignorante” e “tolo”. Entende-se que a pessoa não soube aproveitar-se da oportunidade. Ora, gostaríamos de perguntar se esta mentalidade ajudaria para termos bons políticos e militares? A meu ver, existe muita semelhança entre a postura da sociedade com aquela dos políticos e militares.

Daí que achamos que o problema não está só nos políticos e militares mas também na sociedade em geral.

Identicamente, várias vezes, ouvimos pessoas a afirmarem que o fulano de tal não é puro guineense, é de Cabo-Verde, é português não merece a nossa confiança. O fulano de tal é raça “fundinho”, raça “tchamidur”, é gente da praça, é saltimbanco, etc. Isto faz-se mesmo que a pessoa tenha a competência e esteja a dar a sua contribuição para o avanço do país. Será que esta atitude vai ajudar em alguma coisa? A estrada da avenida principal da cidade, recém-constituída, está sendo estragada. As pessoas carregam varões de construção e arrastam-nos no alcatrão. Quando são interpelados, dizem que a estrada não é do pai de ninguém.

Com base nestes factos mencionados admitimos, que o pensador francês tinha razão ao concluir que o comportamento do individuo ou duma minoria é condicionado pela maioria. Aquilo que os nossos políticos e militares fazem é, até certo ponto, reflexo da sociedade. Precisamos de encarar os nossos problemas de frente e procurar soluções.

A nosso ver, a solução passa pela consciência das nossas fraquezas. Devemos ter a consciência daquilo que nos torna cada vez mais fracos. Uma vez identificadas tais fraquezas, devemos ter a disposição de começar a mudança dentro de nós.

Não obstante a inconsciência da maioria, um pequeno número de guineenses tem a consciência dessas fraquezas e trabalham para despertar a consciência da maioria.

Admitir e assumir que somos fracos e erramos devia ser vista como uma virtude. Mas, conscientemente optamos por assinalar os outros como os verdadeiros culpados, enquanto nós nos fazemos de vítimas, simplesmente porque não somos tão grandes para redimir e dizer eu também errei.

Pois, só as pessoas, grupos e povos conscientes das suas fraquezas é que avançam, porque têm ideia clara daquilo que deve ser melhorado. E não confundem as suas fraquezas com as suas forças. Era bom que as entidades como Estado, organizações da sociedade civil e órgãos da comunicação social se envolvessem duma maneira mais comprometida na tarefa de sensibilização da sociedade.

Esta consciência é necessária não só para a Guiné-Bissau mas para o continente Africano no seu todo.

Alberto Luís Quematcha

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