sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Dinheiro ao serviço de quem Deus ama

“Que o Senhor nos dê a graça da ‘santa vergonha’ diante da tentação da ambição que envolve todos, inclusive os bispos e as paróquias” - Papa Francisco
 Reflexão de Georgino Rocha

Jesus quer que os discípulos tenham critérios firmes no desempenho da missão que lhes vai confiar. E ao longo da sua vida pública pronuncia sentenças de sabedoria, faz ensinamentos de ética relacional, abre horizontes à novidade do Reino de Deus já presente nas realidades humanas, embora ainda não em plenitude. Dá-lhes indicações sobre o comportamento de uns com os outros, a vida no seio da comunidade e a presença activa na sociedade/mundo. E deixa-os sempre com a liberdade de escolha, advertindo para as consequências da sua opção.

Mateus, o evangelista do Sermão da Montanha, acentua a dimensão de serviço que é inerente a toda a pessoa e está presente nas decisões e no agir. Querendo visualizar a mensagem recorre à imagem de “dois senhores”, extraída da experiência humana e acessível aos ouvintes/leitores. Nela representa Deus e o dinheiro. E como ninguém consegue servir a ambos ao mesmo tempo e com a mesma dedicação, também quem quiser segui-lo tem de fazer escolhas, dar o valor adequado a cada um deles, ter prioridades, centrar o coração, ser coerente.

O dinheiro, bem precioso, sobretudo na sociedade actual, toma a forma de economia nos seus múltiplos “rostos” e constitui elemento propulsor para o desenvolvimento integral da humanidade. “Uma economia bem gerida é decisiva para o bem-estar e a felicidade das pessoas e da sociedade”. (J. M. Castillo). O contrário, também se verifica infelizmente, provocando a ruína e a morte de milhões e milhões de vítimas inocentes e poluindo a “mãe” natureza. Por isso, Jesus pronuncia-se tão claramente sobre o dinheiro e a sua função social, incluindo-os na sua mensagem como referente fundamental da ética do discípulo fiel.

A economia sem rectidão ética desumaniza-se e instrumentaliza todos os outros sectores da sociedade, colocando-os ao seu serviço. Converte-se em centro de valores, em pólo de sentido da vida, em ídolo de crenças e práticas. O culto ao deus dinheiro tende a eliminar tudo o que lhe ofereça resistência. E a pessoa, centro e fim de toda a actividade humana, vê negada a sua dignidade e reduzida a sua função. É-lhe imposta a marca de produzir e consumir.

Este modo de pensar e organizar a vida em sociedade contradiz radicalmente a novidade que Jesus vem pôr em marcha. Na sua escala de valores, Deus e o amor que, por igual, tem a todos estão primeiro. Os bens são meios indispensáveis ao serviço da dignidade humana, da vida e do alimento, da habitação condigna e saúde razoável, do trabalho honesto e do descanso revigorante, da contemplação da beleza e da adoração ao Deus bondoso, na sua infinita misericórdia.

O Papa Francisco na mensagem para a quaresma de 2017, em que vamos entrar na próxima quarta-feira, lembra que: “O apóstolo Paulo diz que «a raiz de todos os males é a ganância do dinheiro» (1 Tm 6, 10). Esta é o motivo principal da corrupção e uma fonte de invejas, contendas e suspeitas. O dinheiro pode chegar a dominar-nos até ao ponto de se tornar um ídolo tirânico (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 55). Em vez de instrumento ao nosso dispor para fazer o bem e exercer a solidariedade com os outros, o dinheiro pode-nos subjugar, a nós e ao mundo inteiro, numa lógica egoísta que não deixa espaço ao amor e dificulta a paz”.

E na homilia da missa matutina da terça-feira (21/02), na Casa Santa Marta, reza para “que o Senhor nos dê a graça da ‘santa vergonha’ diante da tentação da ambição que envolve todos, inclusive os bispos e as paróquias”.


Jesus conhece-nos bem e as nossas tendências naturais: a não correr riscos, a alimentar preocupações excessivas, a ceder a inquietações fáceis e duradoiras, a temer qualquer sobressalto sempre ameaçador. E, por meio de imagens belas com as aves do céu e os lírios do campo, aconselha um estilo de vida marcado pela confiança filial em Deus e pela justiça do seu reino, pela valorização de cada dia, sem saudades doentias de um passado que foi ou medo perturbador de um futuro que se aproxima. E o acréscimo que Jesus promete brilhara, por agora, no rosto feliz dos seus discípulos e na convivência solidária entre os cidadãos, na harmonia do universo e na beleza da criação cuidada por todos, sem distinção. Brilhara nas atitudes dos que sabem usar o dinheiro como bem precioso posto ao serviço de quem Deus ama.

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